2 de dezembro de 2011

Tratar da morte

Esta coisa de quando já se teve a morte a viver em casa e se a olhou longamente no fundo dos olhos faz-nos pensar nela de um modo mais desprendido e pragmático. Acho. Ou então é porque vivo sozinha comigo na minha vida e preciso tratar das coisas. Ou, ainda, é porque continuo alemã nas milhentas coisas que ainda não expurguei porque vivo eternamente perdida entre a alma aqui e a mente lá.
Hoje fui tratar de coisas da morte. Não das coisas românticas do testamento que já está feito e selado há anos. Coisas práticas. Peguei nas chaves de ossários e gavetões, meti-me a caminho e fui ver o que abriam no cemitério. Fui tratar de minudências numa Junta de Freguesia que só associo a coisas de morte. Deram-me papéis amarelos de Tempo assinados pela Mãe e antes dela pela Avó. Desencantei quem está onde. Que ossos são os Meus dos Meus. Pedi para me mudarem coisas de sítio. Algures a meio do processo pensei que estava a sentar pessoas à mesa. Quem se senta ao lado de quem para sempre e dei comigo a pensar se, por acaso aqueles Meus que eu não conheci e os que conheci se querem sentar naqueles esquemas, se querem estar com aqueles outros e se já não estarão fartos de estarem uns com os outros. E será que eu quero mesmo ficar ali com eles? Ou querer-me-ão eles ali com eles? Seja como for, decidi juntar-nos todos. Trouxe cópias dos papéis amarelos da Junta de Freguesia, memórias da Mãe viva e da Avó e do que elas faziam quando eram elas as matriarcas e o meu elo nesta história que acaba aqui, uma vez que a família segue por outra via.
Tratar da morte. É isso. O que é preciso é pragmatismo, mas lá que é uma coisa estranha e estrangeira, esquisita na vida que corre, é. Tratar da morte porque é em vida que pensamos nela e a deixamos arrumada.

4 comentários:

Cristina Torrão disse...

A vida e a morte completam-se. Como aqui se diz: gehören zusammen. Sem morte, não haveria vida.

salto para a lua disse...

aprecio o teu pragmatismo. obrigada também pelo comentário!

bom fim-de-semana

mfc disse...

Também sou a favor de deixar tudo "arrumadinho"!!
Beijos.

Fernando Vasconcelos disse...

Talvez Blonde. Não tenho ainda a certeza. Acho que por enquanto ainda estou na fase do pânico. Ou então é porque sou português ...