29 de novembro de 2010

O pão nosso de cada dia



Venho de Lisboa, onde dormi. É Domingo cedo de manhã e não há ninguém na estrada. Penso que tenho de ir ao supermercado às compras de essenciais e não quero deixar passar o fim-de-semana do Banco Alimentar. Faço uma lista mental do que preciso. Pouca coisa: uns legumes, uns camarões e coisas para o Banco. A Paula deixou-me maçãs, romãs e dióspiros quando cá esteve no Sábado e, por isso, não preciso de fruta. Hesito se trago pão. Não. Tenho um resto que é preciso acabar, é pão velho mas paciência.
Depois de chegar a casa, a Paula telefona:
- Blondinha, tenho aqui muito pão que me deram. Vou-te aí levar.
E traz. Muito pão, ao qual eu não consigo dar vencimento e, portanto, congelo mas não sem antes me deliciar no pequeno prazer simples de pão fresco com manteiga (ainda que seja de soja). O meu resto tornou-se abundante como numa qualquer multiplicação perante a multidão bíblica. Mas não é isso que me impressiona, o que me despoleta o pensamento é que na nossa generosidade, haverá sempre quem seja generoso connosco. Pensei isto apenas porque foi fim-de-semana do Banco Alimentar. Pensei isto porque aqui no campo ainda há esta coisa da partilha. Pensei isto porque vem aí uma crise pior do que um céu carregado e é, afinal, é a sociedade civil que se solidariza num ano em que a recolha do Banco Alimentar Contra a Fome superou recordes de generosidade. Pensei isto porque graves espectros se levantam e eu ainda acredito na bondade imanente.

27 de novembro de 2010

Não ter filhos e perguntas estúpidas

- Tens de ter filhos! Senão a quem é que vais deixar as coisas?

Tens de? E as pessoas têm filhos para lhes deixarem coisas? É esta a visão de quem tem filhos? As pessoas têm filhos por obrigação social ou genética ou familiar? É que se é assim, I'm out! Às vezes penso que já ouvi tudo o que havia a ouvir sobre esta questão mas quando me atiram um "tens de" apercebo-me de que a sociedade, por muito avançada que seja, me deve considerar um bicho estranho. Algo ao jeito de: as mulheres têm de ter filhos. Os homens ainda vá que não vá, mas uma mulher sem filhos é uma quase aberração.
Primeiro atiravam-me à cara as maravilhas da maternidade. Durou pouco tempo essa fase.
Passei depois à fase do "tu é que fazes bem não ter filhos". E também ouvi muitas vezes o chavão do "se fosse hoje não me metia nisto". No entremeio, quando adoptei o Spotty, ainda ouvi uma ou duas vezes o infame: "um cão não é um bebé" como se eu tivesse tirado o Spotty da rua para assumir uma maternidade substituta, como se alguém no seu juízo pudesse canalizar para um cachorro os sentimentos devidos ao Homem.
Depois começaram a atirar-me a liberdade à cara. Podes ter carreira, podes viajar, podes dormir, podes ir ao ginásio, podes, podes, podes. Um rol infinito de "podes isto e aquilo". Como se eu fosse uma espécie de projecção de frustrações por vidas incompletas, não sei. Sei que esta fase é a mais longa e a que mais me irrita. Sim, irrita-me, bastante. Sabem lá as pessoas porque é que eu não tenho filhos. Sabem lá as pessoas que contigências me terão levado aqui. Sabem lá que opções eu escolho ou que caminhos me são forçados. Não me interessa que saibam. Não me interessa se o meu estado de não-maternidade me foi forçado ou foi escolhido. Acho que nem eu sei e não perco sono por isso.
Agora que o meu sobrinho Manel nasceu eu já esperava a comiseração pelo meu estado e sim, já ouvi que agora é que eu me decido, como se, por contágio, eu agora pensasse num bebé porque a Mana teve um bebé. Ou então dizem-me que ser Tia também é bom, não tão bom como Mãe, é isso que não acabam na frase.
Claro que já pensei como seria ter um filho. Claro que já pensei que na minha vida de seguranças e estabilidades relativas até pode ser um desperdício não ter filhos. Claro que tenho todas estas coisas para deixar. Curiosamente não é nesta Casa que penso, não é nos terrenos. Penso em coisas tão prosaicas como os meus anéis. Os anéis que recebi, os que comprei pelo mundo fora, os que significam coisas importantes e os que são só bonitos e como seria um dia pegar nos cofres onde os guardo e dá-los em legado a alguém. Claro que não é um divórcio monstro que se arrasta nos tribunais há mais de dois anos que me impediria de ter filhos. Claro que também não é estar sózinha ou ter alguém que me impede ou não de ter filhos. É só que a Vida nunca se virou para aí.
E se um dia eu acordar e já for tarde? É um dia em que eu acordo e já é tarde. Aprendi a duras penas que vivemos nas nossas decisões e que nos arrependimentos incuráveis também se vive. Se um dia eu acordar e já for tarde, é tarde para mim, não é tarde para mais ninguém. Ninguém tem nada a ver com isso e, portanto, não me digam coisas obscenas como "tens de" porque sou eu, e mais ninguém, que habita na minha Vida, sim?

26 de novembro de 2010

Casacos de Inverno



O que vestir um casaco de Inverno pela primeira vez na estação tem de bom é o que se encontra nos bolsos que transitou à socapa. E assim hoje, num dos bolsos, um guardanapo da Whole Foods vindo da América e, no outro bolso, um bilhete de metro de Londres com data de Maio de 2010. E não é que eu me ia embora?...

25 de novembro de 2010

Vai ser um dia bom!

7 da manhã, 7º.
Vou estar 12 horas na faculdade.
Tenho 227 alunos de licenciaturas em pautas (fora as miudezas ERASMUS e os de outros ciclos).
O meu gabinete está a bagunça típica de meio do semestre.
Mas...
O nascer do sol está magnífico.
Na rádio do carro a música é tão alegre.
Sim, vai ser um bom dia (pelo menos até eu dizer: aleluia, acabou!).

24 de novembro de 2010

Greve Geral (?)

O que me irrita no sindicalismo é a cassetice e o esquerdismo à anos 70. Do Governo já sabemos a asnice. E da parte dos sindicatos é sempre a mesma cantilena: "A greve foi um sucesso! O país parou!" e não passam disto. Não há números, não há factos, só há a vacuidade do "foi um sucesso, a luta dos trabalhadores é justa". Eu até concordo muito bem que a malta proteste e faça greves e saia à rua e invective o Governo e reivindique e esses etcs. todos mas o que eu gostava mesmo mesmo é que este país não precisasse de um par de sindicatos passadistas e se organizasse civicamente para dizer: caramba que já chega! Quando é que aprendemos a andar sózinhos sem precisarmos ir a toque de caixa muito bem-comportadinhos estilo mulinhas de carga com pálas nos olhos?

23 de novembro de 2010

Excepções?!

Será que li bem? Ou que ouvi bem as notícias? Afinal os cortes salariais na infame Função Pública, causa máxima dos males deste país, são só para alguns? É como eu digo, todos os dias há mais um episódio da insanidade que acomete a classe que nos desgoverna. Se dantes eu ainda achava uma certa graça, daquelas graças sarcásticas que mascaram o profundo desprezo cultural com que encaro a classe, agora acho que nem o pior sarcasmo me mascara a habitual boa-disposição e, portanto, insanes são doentes mentais, coitadinhos inconsequentes desprovidos de tino, gentinha desta, ao invés, é apenas... gentinha. Gentinha para quem a noção de Estado é uma noção de momento, o momento em que é poder(zinho). Gentinha cujos conceitos democráticos se balizam entre os favoritismos e os favorzinhos. Gentinha sem bússola e sem espinha. Não são os cortes o que mais me irrita no meio deste atoleiro, é a cegueira e o acumular de desnorte que nos trouxe aqui. O que mais me irrita é, afinal, o que sempre mais me irrita: a burrice sem pressa ou vontade para desemburrar.

Ó por favor!

Alguém me impeça de ler o "Jornal de Negócios" ou, já agora, qualquer jornal! Eu já não posso ver tanto FMI isto, FMI aquilo, vem o FMI, não é preciso o FMI. Apre!! Decidam-se, caramba!

22 de novembro de 2010

Walking in Mother's shoes



É isso, às vezes sinto que calço os sapatos da Mãe. Não que me sirvam nos pés mais pequenos mas porque somente vivendo percebemos. E eu agora percebo...

21 de novembro de 2010

Der Papst und das Kondom

Falso alarme. Ainda não é desta que se dirá deste Ratzinger:
- Na, endlich!!!
Diabo para tanta teimosia.

20 de novembro de 2010

No plants, please!

Eu não tenho green fingers.
Eu não gosto de jardinagem.
Eu não falo com as plantas (a não ser que sejam tílias centenárias ou carvalhos gigantes).
Eu preciso de jardineiro.
Eu não me dou com vasos e regas.
Eu estou farta de pedir que não me dêem plantas vivas, please!

- Blondinha, trago-te aqui esta plantinha para pôres num vaso na varanda da entrada que tens a varanda muito despida.

Eu sei! Fui eu que a despi à medida que as plantas anteriores foram entregando a alma ao Criador! E não preciso de plantas envasadas e presas numa varanda quando há um jardim lindo à volta!
Agora tenho ali uma Rosa do Cabo enorme dentro de um balde com água e amanhã tenho de calçar uns botins e ir encher de terra uma ânfora giríssima que me estava a decorar o quintal só para não ser mal-educada e deixar morrer a planta. Ó vida doméstica dum caraças! Era tudo o que me estava a apetecer! Será tão esquisito assim eu não gostar de vasos? E nem quero pensar se depois da varanda da entrada ainda se lembram de fazer pelas três varandas que sobram. Ó pela madrugada!! Ai que vontade...

19 de novembro de 2010

No país das tolerâncias


Fazendo bem as contas ao desperdício dá qualquer coisa como: um dia de tolerância de ponto por causa de Sua Santidade, meio dia de tolerância em Lisboa por causa do Papa, meio dia de tolerância na Invicta por causa do Ratzinger e um dia de tolerância em Lisboa por causa do Obama e da Carla Bruni entre outros. Some-se os feriados e semi-greves e greves (todos muito justos, é claro) e eis-nos na república das batatas (que bananas não é muito a nossa praia, é "derivado ao" clima...).
Sabem o que eu gostava mesmo? Que o Governo divulgasse, tipo factura do supermercado discriminada, as contas do quanto nos custou a vinda do Papa e a realização da cimeira da NATO, a sério que gostava. Muito a malta gosta de festas neste país, caramba! (pronto, ok, foi a costela alemã a falar que eu nem tenho nada contra folguedos e afins).
Pois eu vou dividir o meu dia entre acabar de ler uma tese, escrever um abstract e no entremeio ir a uma sessão de localizada e a uma de body pump, sessão dupla que também sou filha de Deus, ora essa! E ainda vou fazer mais umas coisinhas que o dia tem de render (mas essas não interessam nada).

17 de novembro de 2010

E se um tipo me pedisse casamento


e me oferecesse o anel da mãe?
Eu enojava-me até à medula com a falta de imaginação e o complexo edipiano à espreita e respondia:
- You got some serious issues, dude!
Mas é que nem pela Coroa de Inglaterra! Livra!

16 de novembro de 2010

E como será a minha vida?

Deu-me para pensar na questão porque a Turmalina disse lá no sítio dela que aprende com a minha maneira de viver. Engraçado, nunca pensei no que é que pensa quem lê o que lê quando por aqui passa. Como será essa minha vida? Que espécie de pessoa será esta? Como é que se dará consistência de vida e de gente às imagens parcelares que aqui deixo? Será que me lêem numa aproximação àquilo que sou? Ou far-me-ão uma fabricação? Não adivinham, por exemplo, que ontem fui ver uma exposição ao CCB e comprar pastéis de Belém a horas mortas. Não saberão mais do que o crivo que aqui deixo. Mas, mesmo assim, o suficiente para eu ter uma vida. Curioso como me deu para pensar...

15 de novembro de 2010

Bacalhau com broa inventado à Blonde


Show di bola! Ou isso ou então a minha veia de Chef adormecida desde forever resolveu vir ao de cima.
Ingredientes:
Bacalhau demolhado em lascas
Broa de milho
Couve (não sei a espécie, esta veio do quintal da Paula)
Vários dentes de alho
1 folha de louro (acho que não é necessário mas o loureiro aqui do quintal é muito generoso e portanto tudo marcha com louro)
Azeite
Numa taça grande desfazer em pedacinhos a broa e regá-la com bastante azeite. Cozer as lascas de bacalhau e depois alourá-las em azeite e alho até estarem bem embebidas e meio refogadas. Na água de cozer o bacalhau cozer a couve partida em pedaços. Depois juntar a couve ao preparado de bacalhau e mexer até os ingredientes estarem ligados. Verter o bacalhau num pirex de ir ao forno. Com uma concha retirar um pouco da água de cozer a couve e o bacalhau e molhar a broa. Colocar uma camada de broa sobre o bacalhau. Levar ao forno a alourar. Et voilá!
Foge, eu até me surpreendo!! Quem diria há um ano que eu ia passar horas entretida na cozinha a inventar? E gostar? Que isso é o que mais me espanta!

14 de novembro de 2010

Só para rir

Timor-Leste disposto a ajudar Portugal.
Ao que isto chegou! Já não bastava termos o Chávez e a China a jogarem ao bom samaritano agora ainda nos aparece este jóquer. Nós?!, a recebermos ajuda do país mais pobre do mundo? O sentido de ironia universal é, de facto, uma coisa hilariante. Palavra, eu todos, mas todos, os dias ainda me surpreendo.
O manancial de inspiração que Gil Vicente encontraria aqui se cá viesse e não havia "Barca dos Infernos" que resistisse. Aliás, eu duvido bem que o Inferno nos queira para alguma coisa.

Eu ali em baixo nas etiquetas tenho "struck numb" mas isto é mais, muito mais, do que "struck numb". Isto é a estupidificação total ante o cenário deste "Portugal Contemporâneo". Vai uma aposta que amanhã ainda há uma coisa mais fenomenal? E mais hilariante? E mais inesperada?

13 de novembro de 2010

Conta do supermercado

Blonde vai às compras. Blonde, que anda para lá de pissed off com o governo e a crise e novamente o governo, decide olhar melhor para o papelito com o somatório das comprinhas. Amigos, aquilo é um tratado à imbecilidade. Mas eu fiquei com uma teoria...
- pão, frutas e peixe, IVA a 6% (sim senhora, as slow foods fazem bem e são nutritivas e etc.);
- miolo de camarão, IVA a 21% (ok, concedo que é uma vitualha dispensável e ninguém morre se um Bacalhau à Conde da Guarda não tiver lá pelo meio uns camarõezitos);
- vinho tinto, IVA a 13% (bom, convenhamos que não é a coisa mais essencial mas, tratando-se de um país produtor e o vinho é um importante elemento cultural e tal, a coisa nem é escandalosa);
- papel higiénico, IVA a 21% (aqui começa a droga a fazer efeito, aquilo andam todos marados e depois têm ideias alucinadas destas);
- revista de informação (para o caso a Visão), IVA a 6% (pergunta absolutamente idiota: mas onde carga de água é que as revistas são mais indispensáveis que o papel higiénico?).

Teoria Blonde:
a). há que dar a noção de que se está a fazer pela literacia da população e que a informação é um direito basilar ou;
b). como as revistas de informação geralmente malham na classe política, palpita-me que o uso que a dita lhes dá servirá outros propósitos, diremos de higiene mental, e vai daí a troca porque, lá está, trata-se de um produto de absoluta necessidade...

Ele há com cada uma neste país!!

12 de novembro de 2010

Choques eléctricos já!

Leio na Sábado desta semana que crianças com dificuldades a Matemática melhoram a aprendizagem com choques eléctricos no cérebro.
Estão à espera de quê para electrificarem os cérebros dos nossos políticos, hein?! Ainda por cima o efeito dura seis meses!!

Do São Martinho


Eu nem ligo ao São Martinho e não teria vindo com isto para aqui não fosse a Zana e um aluno meu da República Checa.
Lá na faculdade sabem dos meus ascendentes alemães e, chegando à aula, enquanto não se acalmavam e acordavam para a evidência dura e inclemente das 8.30 da matina, lá lhes perguntei se sabiam que dia era ontem. Ó sim, claro, Dia de São Martinho. Disse-lhes que na Alemanha também existe e que se chama Martinstag e que fazemos Laterne para iluminar o dia (eu fazia-as em copos de iogurte de vidro - os copos, não o iogurte, óbvio, mas eu não sei a ordem disto em Português, óbvio também - com velinhas lá dentro e todos decoradinhos, acho que ainda aí tenho umas quantas no baú das memórias). Aqui come-se castanhas e, disse-me uma aluna ontem que neste dia não é suposto chover. Não sabia. Vai daí um aluno meu da República Checa disse que também têm o Dia de São Martinho e que lá São Martinho vem montado num cavalo branco.
- A white horse?! - I ask.
- Sim, é a primeira neve.
Achei delicioso!

10 de novembro de 2010

À força de memorizar a letra

... nas sessões de fitball acabei por encontrá-la. Desconhecia, e a profª da aula não sabia que música era esta que estava num cd marado.

Lembra-me coisas e como o orgulho, sendo uma virtude, é uma desgraça...

9 de novembro de 2010

7,02% e agora?

Então, agora declaramos a nossa incapacidade para nos governarmos. Simples, não?
Que humilhação...

The joys of country living...

4.17 da matina dispara o alarme por falta de luz eléctrica. E agora? Desligo o telemóvel para os tipos não me telefonarem a chatear que faltou a luz e o geringonço está sem power? Espera… se desligo o móvel também tenho de desligar o fixo, dah! Shit que não me apetece sair da cama! Vem a luz, graças aos santinhos.
6.07 da matina acordo com um clarão que mais parece foguetório de Ano Novo e dispara o alarme (again!). Espero a ver se vem a luz. Não vem. Saio da cama, assim como assim faltam três minutos para o despertador tocar. Desço à despensa à luz do telemóvel (que é um dos variados usos que o dito tem), com cuidado para não me estatelar escadas abaixo e tento perceber onde tenho velas e lanternas (que não têm pilhas). Encontro velas e preciso de algo primitivo como fósforos. Não posso pôr a máquina do café a funcionar e não tenho a casa-de-banho aquecida. Novo clarão. Hmm… o dia promete. E chove que se farta.
É, vidinha de campo…

8 de novembro de 2010

Ai o caraças...

Voltou a anedota do "5 à sec" e agora é a do Hi5. Ó meus morcões, num há pachorra, tá? Andam há meia dúzia de anos na ribalta e já se julgam os reis da cantareira...

7 de novembro de 2010

Estamos a conhecer-nos

Nunca segurei nada tão inestimável. E nunca um abraço me foi tão quente, tão sem pensamentos. Finalmente estou a conhecer o bebé Manel. O irónico é que, tendo sido a primeira pessoa a vê-lo na maternidade, sou a última a vê-lo cá fora à conta da gripe dos últimos dias. Ontem acabou-se a quarentena e pude ir vê-lo.
Nunca fui muito fã de bebés, confesso. Não os sei distinguir. Acho-os todos um bocado apáticos. Não sei comunicar com eles e acho-os intimidatórios e pouco sociáveis. Acho até que a única vez que algo parecido com um resquício de instinto maternal me passou pelos ossos, foi a adopção do Spotty e mesmo aí não sei se o que senti não foi, antes, obrigação moral de tirar aquele cachorrito do frio da rua. Recém-nascidos então fazem-me muita confusão e pergunto-me sempre como é que a espécie sobreviveu com crias destas.
Quando cheguei à maternidade para ver o Manel pensava que me ia apaixonar no incondicional e imediato. Pensava que por ele ser meu sobrinho, filho da Mana adorada, eu me ia derreter por ele sem ser preciso mais nada. Pensava, em suma, que a genética, o instinto de clã ia ser suficiente. Ao invés, surpreendi-me porque era na Mana que eu me concentrava, era pela Mana que o meu amor jorrava. Sim, o Manel era lindo, não tinha aquela cara encarnada e cheia de pregas dos recém-nascidos, era gordinho e, sobretudo, calminho. Mas não lhe encontrei parecenças connosco. Ainda agora não consigo ver traços que digam que ele vem de nós. Gostei dele por ser filho da Mana mas não deixava de ser um bebé e receei seriamente se as minhas antecipações jubilosas não tinham sido um exagero nos últimos meses. Até ontem...
Cheguei à casa da Mana com uma espécie de determinação em desfazer equívocos sentimentais e ver o que é que o meu coração sentia pelo Manel. Fiquei a sós com ele que dormia. Fiquei hirta sem lhe tocar com medo que acordasse e me mandasse embora aos gritos. Naquele momento pensei sinceramente que sim, que tinha antecipado demais e que o Manel, era, afinal, um bebé que não é meu e que, ser meu sobrinho ou não, não ia fazer com que nos déssemos de maneira diferente da que eu me dou com os outros bebés. Mas ele não acordou nem gritou nem me mandou embora. E eu fui descontraindo. E fui começando a tocar-lhe: primeiro a cabeça macia, depois as orelhas e quando dei por mim tinha a mãozita dele envolta no meu dedo agarrando-o com força. E quando acordou não teve medo de mim e não se assustou e não me mandou embora. E eu pude pegá-lo e sentir-lhe a roupa quente e cheirá-lo suave e encostar-lhe o meu rosto. E depois ficou-se ali aninhado em mim, os dois a conhecerem-se como passageiros que vão partilhar um vagão num comboio prestes a dar a volta ao mundo. Adormeceu. E o que eu me espanto de espanto é como é que um bebé adormeceu em mim. Como é que um bebé quis adormecer ao colo de uma mulher que tem medo de bebés. Acho, no fundo, que foi o Manel que se aproximou de mim: "Anda Tia, vem daí." Eu que pensava que ia ser ao contrário: "Anda Manel, vem daí com a Tia." Paralisei nos meus excessos de antecipação e o Manel resgatou-me com aquele abandonar-se no meu colo e deixar-me perceber que eu tenho colo.
Hoje, quando acordei aqui na Casa Grande, desejei que o Manel estivesse aqui...

6 de novembro de 2010

Flores em Novembro


Levei-as à Mãe.
Com o orgulho de quem as colheu e de quem diz: "Está bonito o jardim, Mutti. De onde olhas tens orgulho também? Em mim, no jardim que não deixei morrer depois de Ti?"

Que saudades, Mutti... Que não passam.

5 de novembro de 2010

Diários agrícolas: começou a confusão

aqui tinha falado do meu pedaço de chão, do como me estou a reencontrar com um monte de coisas de um passado trágico que aos poucos vão encontrando um caminho para a luz, ou pelo menos, vou tentando que encontrem um caminho para dentro da minha vida. Tem sido assim com a Casa e agora vai ter de ser assim com os torrões de terra, que, tendo estado ao cuidado de terceiros generosos o suficiente para me libertarem do peso da responsabilidade, eu agora quero tomar em mãos. Algum dia tinha de ser...
Primeira precaução da Blonde agricultora: ver marcos e conferir extremas. Há uns anos mandei fazer um levantamento topográfico que enfiei para dentro de uma gaveta com um dossier chamado "Terrenos". Toca de tirar cadernetas prediais e mapas e ver o estado da coisa.
Sem surpresa, um idiota de um vizinho achou por bem fazer uma dependência qualquer numa das extremas confinantes com um dos terrenos aqui da Blonde. Tudo ok não fosse ter-se lembrado de abrir uma janela e... enfeitá-la com duas pombas de louça. Até lhe podia perdoar a ousadia não fossem as pombas, que eu sou uma mulher de estilo, ora essa! Tirei fotos (horrorosas como só podiam ser), fui à Conservatória pedir os dados do dono das pombas de louça e entreguei uma petição na Câmara para me resolverem o problema.
Chegou a resposta.
Tarara, tarari, sim senhora que eu tenho muita razão (também lá na Câmara não devem gostar de pombas de louça) e... agora vem a melhor parte e até vou citar:
"Informamos que na presente data, foi enviada comunicação ao proprietário do prédio em questão para proceder ao respectivo licenciamento administrativo."
?! Além da pontuação grosseira, o que é que isto quer dizer exactamente? Que se o dito proprietário licenciar a janela eu tenho de gramar com as pombas? Mas eu não quero janela nenhuma aprovada porque é por isso que existe um artigo 1360 do Código Civil!

Acho que o meu caminho em direcção à agricultura começa a esbarrar numa coisa viscosa chamada "poder local". Lá vou eu meter pés a caminho e perguntar ao Vice o que raio é aquele relambório. Hmm... algo me diz que cheguei ao pântano...

4 de novembro de 2010

O melhor de sempre



E eu que até acho que tenho uma colecção jeitosa de concertos no currículo mas este... Ainda estou overwhelmed. Ultrapassou tudo o que eu podia esperar. Quis pôr aqui um vídeo em que o Bubblé canta sem mike e cala 30.000 pessoas mas devo estar a ter um ataque de blondite aguda e não consigo descarregar o dito. Deixo uma pic do "verdadeiro artista" em banho de gente.
Lembrei-me tanto daquela noite em que o conheci. Está mais magro. Substituiu os ténis por sapatos. Mudou de bow tie para gravata mas é a mesma voz, a mesma afabilidade. Não havia tempo para tudo. Não houve "Lost". Não houve "Hollywood" mas houve aquela canção que me guiou por entre a multidão até ele, até ficarmos cara-a-cara, os dois, sem mais ninguém, "Me and Mrs. Jones", na versão mais extraordinária de todas as que a canção tem tido.
Ele diz que vem cá no Verão. Se assim for, I'm in. Verdade, foi o concerto que mais me encheu de alma a alma...

3 de novembro de 2010

Finalmente vejo o Bubblé!

Já vos disse que conheci o tipo? Oh yeah... Eu ainda não era PhD e ele ainda não era "o" Michael Bubblé. Londres. Noite cerrada e chuva miudinha. Venho de Oxford de duas palestras que dei à frente dos gurus do império. Estou cansada. Sigo-lhe a voz calma em "Me and Mrs. Jones". Vejo-o de tuxedo e ténis brancos encardidos. É forte e tem ar de jogador de baseball. Trocamos umas palavras e "prometo-lhe" a fama que ele vai ter. Ri-se. Pergunta-me se não quero comprar um cd que ele tem numa pilha debaixo do piano. Respondo que prefiro comprar-lhe os cds que ele vai meter na Billboard. Tomo um chocolate quente e fico ali a ouvi-lo enquanto me acalmo da maratona dos últimos dias. Venho embora para o meu PhD e ele segue para uma carreira.

Logo à noite estarei ali, em frente dele, no futuro do passado. Congrats Michael! You sure the hell made it!

2 de novembro de 2010

Ó sim, também há o reverso da questão

E eu entendo perfeitamente que à infame pergunta "o que é que eu posso fazer pelo meu país?" muita gente pense na carrada de malta que de tanto ter o país a fazer por ela (e percorro desde o bas fond do rendimento mínimo de inserção social ao CEO de empresa estatal/municipal) deveria pensar agora em fazer pelo país. Afinal, a reciprocidade é uma coisa muito democrática. No meu caso, e lamentando o "umbiguismo" que me ataca por estes dias, vejo uma factura pesada de deves e haveres da qual me considero grande credora. E digo isto no sentido mais absolutamente patriótico do termo.

1 de novembro de 2010

O que é que eu posso fazer pelo meu país?!

Tá boa esta! O que é que eu posso fazer pelo meu país?! E que tal: o que é que o meu país pode fazer por mim? Essa sim, era uma novidade.

A SIC lembrou-se de ir perguntar isto aos portugueses. As respostas foram mais ou menos a minha com a atenuante de as pessoas serem muito conformadas e o português ser um bom burro de carga, saco de pancada também se aplica, e eu sou muito protestante (no sentido laico), benza-me Deus.

É que estou mesmo farta desta onda imitadora, a começar pelo Dr. Jorge Sampaio no Prós e Contras de há umas semanas, que se lembrou de pegar no Kennedy e na América, exactamente os melhores modelos para Portugal copiar (é que tem mesmo tudo a ver!) e desatar a pedir a epítome patriótica ao povo. Fartinha. E como eu costumo discutir com os meus alunos este exactíssimo discurso na versão original, óbvio, aqui fica para vermos que sim, dá mesmo vontade de ajudar este país.

E ao terceiro dia...

... continuo aborrecida. Que chatice! Agora tenho tosse, dá para crer? Decidi que de hoje o diabo da gripe não pode passar. Amanhã são doze horas de faculdade e ando à espera de Quarta-feira há pelo menos cinco anos. Dê por onde der, na Quarta eu tenho de estar linda e resplandecente e ponto final! Ó que gaita de fim-de-semana, prolongado ainda por cima. Tanta coisa para fazer, tanta coisa para acontecer e eu encostada às boxes. Azar do raio! Fui, antes que encha o blog de impropérios!